Restos de Colecção

9 de março de 2025

Hotel Royal Belle Vue

O "Hotel Restaurant Royal Belle Vue", foi inaugurado em 10 de Julho de 1909, na Praia das Maçãs. Foi seu promotor o capitalista Eugène Levy, grande dinamizador da Praia das Maçãs. O projecto foi da autoria do arquitecto Miguel Ventura Terra (1866-1919), e a construção ficou a cargo de Francisco dos Santos.



"Diario Illustrado" de 10 de Julho de 1909

Em 25 de Abril de 1908 aquando da cerimónia do «pau de fileira» o jornal "Gazeta de Cintra" noticiava:

«Pela tarde do dia 18 realizou-se na aprazível Praia das Maçãs a tradicional festa da collocação do "pau de fileira" na magnifica propriedade em construcção, e destinada pelo nosso amigo e abastado capitalista Mr. Eugéne Levy ao estabelecimento de um grande hotel, o qual decerto, e especialmente na estação calmosa, deve não só tornar-se de muita utilidade para os numerosos forasteiros da capital, como irá dar uma agradável animação aquella formosa praia.
Na construcção do excellente  edificio a cargo dos Srs. Ventura Terra, conceituado architecto e Francisco dos Santos digno fiscal de obras do municipio, teem trabalhado 36 operários, aos quais o generoso proprietário offereceu por occasião da festa, um excellente jantar, gratificando pecuniariamente todo o pessoal.»


"Hotel Royal Belle Vue" à esquerda no postal, ainda em construção

Projecto inicial e publicado na notícia atrás mencionada

Segundo a gravura publicada no mencionado jornal (gravura anterior), e atentando à configuração final inaugurada, depreendo que apenas terá sido construída uma primeira fase do Hotel - o bloco do topo oriental - tendo ficado a faltar completar o projecto inicial, bem mais grandioso. Isto depreendo eu, repito ...

Observe-se a empena poente (bem diferente da nascente), parecendo que "espera" outro bloco a encostar num futuro ...

18 de Maio de 1909

«O projecto e iniciativa estiveram a cargo de Eugène Levy. Traçaram-se novas ruas, macadamizaram-se estradas, regulamentaram-se as construções, organizaram-se os espaços, e, segundo um projecto do arquitecto Ventura Terra, proveu-se à construção do Hotel Royal Belle Vue, construído por Francisco dos Santos. Esperava-se que o referido Hotel impulsionasse o turismo balnear, tendo-se apostado, por isso, na higiene, elegância e conforto. O Hotel Royal possuía água potável, directamente canalizada para o restaurante, e iluminação eléctrica em todos os quartos.
«Por seu lado, a estação telégrafo-postal, instalada em frente ao Hotel, o telefone Praia-Sintra-Lisboa e o serviço médico permanente existente na região, completavam este empreendimento da Praia das Maçãs.» in:  Centenário da República,1910-2010. (in blog "Provocando")


14 de Julho de 1909


"Hotel Royal Belle Vue" ao fundo da Avenida Eugéne Levy

Este hotel tinha sido concebido para receber a aristocracia e, em 22 de Julho de 1909, o jornal "Diario Illustrado" informava:

«Os importantes melhoramentos ultimamente realisados n'esta praia, teem chamado grande concorrencia, não sendo difficil prever que este anno sera a praia das Maçãs um ponto obrigado de muitas reunides elegantes.
Na terça-feira passaram alli o dia, jantando no Hotel Royal Beile Vue, os srs. Condes de Figueiro, Eduardo Perestrello e esposa, Joaquim do Espirito Santo Lima e esposa, Baroneza de St. George, D. Maria de Vasconcellos e Almeida, D. Maia de Mello e Castro (Galveias), Simão Lopes e D. Antonio de Almeida Correia de Sá, regressando a Cintra á noite.
Tambem se acham hospedados no referido hotel Belle Vue, ha pouco inaugurado, os srs. Amelio Henrique do Rego Barros e familia e dr. Santos Loureiro e familia.
Hoje é inaugurado o «Lawn-tennis» por um grupo de jogadores da nossa primeira sociedade.»


13 de Agosto de 1909

 

23 de Agosto de 1909


A seguir à implantação da República a 5 de Outubro de 1910 a sua frequência apenas mudou de aristocracia monárquica para aristocracia republicana. Ou seja a frequência dos Marqueses foi substituída pel de Ministros, Condes por Conselheiros … Exemplo disso a estadia de Afonso Costa, Chefe do Governo e dirigente do Partido Democrático, em 21 de Outubro de 1913, que deu azo a uma tentativa do seu assassinato, durante um «Complot», que pretendia instaurar de novo o regime  monárquico.

Na revista "Ilustração Portugueza" de 6 de Outubro de 1913

O "Hotel Royal Belle Vue", não durou muitos anos, pois a 17 de Novembro de 1921 foi alvo de um violento incêndio que o destruiu por completo. A propósito ...

«Registou-se um pavoroso incêndio no Royal Hotel Bellevue, ficando o edificío praticamente destruído.(...)
Com autorização e até convite do Sr. Garcia, o eléctrico levou não só os bombeiros e o seu material como até os populares que ali se encontravam.» in 
 jornal "A Voz de Sintra" do mesmo dia.


À esquerda no postal os "restos mortais" do hotel, após o incêndio

«Também José Alfredo Azevedo, refere a destruição do "Hotel Royal Bellevue", e o facto de «a bomba de picota, que os bombeiros possuiam, ser transportada numa vagoneta atrelada a um carro eléctrico, o transporte mais rápido daquele tempo, conduzido pelo chefe de movimento da Sintra Atlãntico, Cândido do Souto, que transportou, também os bombeiros tendo feito o percurso no tempo de 25 minutos, o que foi um recorde.» in blog "Rio das Maçãs".

Outro "Hotel Royal" viria a ser construído na Praia das Maçãs, mas desta vez pelas mãos de Evaristo Sernadas. Não consegui saber o ano da sua abertura.

 fotos in: Hemeroteca Digital de LisboaBiblioteca Nacional DigitalArquivo Nacional da Torre do TomboDelcampe.net, Rio das Maçãs

2 de março de 2025

Salão Vauxhall e Salão Meyerbeer

O "Salão Vauxhall" ou "Salão Vaux-Hall", propriedade de Francisco Vianna Ruas, foi inaugurado em 21 de Janeiro de 1864. Instalou-se nas lojas do penúltimo prédio à direita, que se encontrava na Rua Nova da Palma, no Socorro e antes de chegar à Carreirinha do Socorro (hoje Rua Fernandes da Fonseca), vindo do Rossio, onde viria a ser construído o "Theatro do Principe Real" inaugurado em 29 de Setembro de 1865. Na sequência da implantação da república, viria a ser renomeado de "Theatro Apollo", em 11 de Outubro de 1910.



17 de Janeiro de 1864

20 de Janeiro de 1864


Localização do "Salão Vauxhall" e depois "Salão Meyerbeer", no rectangulo desenhado a preto


"Teatro Apolo", em cujo terreno onde estiveram instalados os "Salão Vauxhall" e "Salão Meyerbeer"

Francisco Vianna Ruas « ... era um afamado mestre d'obras e proprietario d'uma estancia de madeiras á Boa Vista. Foi ele quem edificou o teatro do Gymnasio. O velho Ruas achou-se de uma vez emprezario do theatro de S. Carlos. Dera com os burrinhos n'agua o emprezario Iork, a quem o theatro fora adjudicado por tres annos.» (Sousa Bastos)

O seu nome "Vauxhall" (nome dos jardins de lazer de Londres) terá sido inspirado no existente em Bruxelas, com o mesmo nome "Vauxhall de Bruxelles" e que tinha sido inaugurado num jardim dessa cidade em 1761, e que ainda hoje existe. Em Paris, outro com a designação de "Vaux-Hall de Torré" inaugurado em 1769.


"Vauxhall de Bruxelles" (em gravura do século XVIII e em foto actual)

O "Salão Vauxhall", promovia bailes de máscaras e concertos de polkas, valsas e mazurkas. Os bailes tinham início às 8 horas da noite terminavam às 3 horas da manhã, com preços de 300 réis e 400 réis para a galeria. Não teve sucesso e teve uma existência de messes, tendo encerrado pouco tempo depois de ter aberto.

Aproveitando o mesmo local, para sala de entrada e botequim, e ocupando todo o prédio da esquina da Rua Nova da Palma com a Carreirinha do Socorro, foi logo construído um novo salão para concertos, o "Salão Meyerbeer" do mesmo proprietário, sendo a orquestra dirigida pelo maestro Arthur Frederico Reinhart. O nome do Salão ficou a dever-se a Giacomo Meyerbeer (1791-1864) - nascido alemão Jakob Liebmann Meyer Beer -, compositor e maestro alemão da época do Romantismo. Tinha morrido no mesmo ano de 1864, em 2 de Maio.


Giacomo Meyerbeer (1791-1864)


Capa de pauta da música editada pela casa "Auguste Neuparth" da Rua Nova do Almada

 2 de Setembro de 1865

«Quando Meyerbeer deixou de existir, um compositor qualquer lembrou-se de fazer uma marcha funebre dedicada á memoria do immortal auctor da Africana, e foi apresental-a a Rossini, para que este desse a sua opinião.
- Então que tal acha a minha musica, perguntou?
- Muito bôa, respondeu Rossini, mas seria melhor que você tivesse morrido e Meyerbeer escripto a marcha!» in:
jornal "A Nação".

O "Salão Meyerbeer" foi inaugurado em 22 de Dezembro de 1864 e ... «Abriu hontem o bello salão Meyerbeer as suas portas ao publico. A concorrencia não foi extraordinaria mas a noite passou se agradavelmente, e a orchestra executou magistralmente o seu programma.» Os bailes começavam às 8 horas da noite e terminavam à 1h da manhã, fechando o estabelecimento às 3 horas da manhã.


22 de Dezembro de 1864


24 de Dezembro de 1864


Planta onde é indicada a localização do "Teatro Apolo"

O sucesso, também, não foi grande e os lucros obtidos foram escassos, e Francisco Vianna Ruas encerrou-o logo de seguida e transformou-o em teatro, Aproveitando as paredes, «transformou o salão n'um modesto theatro e convidou o actor Cezar de Lima a associar-se a elle para formar companhia.» As obras começaram em Julho de 1865 e inaugurou-se o "Theatro do Principe Real" em 29 de Setembro do mesmo ano. Em 11 de Outubro de 1910, viria a mudar de designação para "Teatro Apolo


"Teatro Apolo" à esquerda na foto

23 de fevereiro de 2025

Lanalgo

Os Armazéns "Lanalgo" , foram inaugurados em 14 de Dezembro de 1942 na Rua de Santa Justa, 42, em Lisboa. Eram propriedade de «três profissionais distintos e de comprovada experiência» Francisco Santos, Mário Araújo e António Marques Delfim.


A "Lanalgo" instalou-se no edifício onde tinha funcionado, no 1º andar, um armazém de fazendas e artigos de retrozaria, da firma "David Martins, Lda.", propriedade de um dos irmãos Martins do "Eduardo Martins & C.ª". Na loja de esquina com a Rua dos Correeiros, tinha funcionado a sapataria e chapelaria "Amazonas".


Edifício onde se instalaria a "Lanalgo"

Em 1945, o livro "Praça de Lisboa" escrevia as seguintes linhas, acerca deste estabelecimento:

«Dedicando-se ao comércio de tecidos e novidades para senhoras e homens, esta casa alcançou situação de apreciável relêvo na preferência do público de Lisboa e da pro
víncia porquanto, orientada com superior e seguro critério, não só timbrou sempre em bem servir a clientela com artigos de escolhida qualidade como, fugindo à rotina, pro-
curou dotar o seu vasto depósito com um sortido de fino gôsto.
Não se submetendo integralmente às leis da moda, decaída no domínio comum e, pelo contrário, colaborando na criação de modêlos originais que realcem a elegância feminina, Lanalgo, L.da, em sêdas e algodões, apresenta à sua clientela estampagens exclusivas que, por vezes, constituem os mais belos padrões de Lisboa.
Havendo ocupado dois amplos andares do edifício que da Rua de Santa Justa contorna para a Rua dos Correeiros, êste estabelecimento dispõe de magníficas e modernas
instalações para venda e depósito, sendo difícil deparar na Baixa casa que possua semelhante capacidade.
Aproveitando tal possibilidade, Lanalgo, L.da revestiu-se dum grande e excepcional sortido comprado directamente nas mais acreditadas origens nacionais e estrangeiras, a preços que lhe permite vender nas melhores condições. E assim as senhoras encontram ali uma variedade imensa de tecidos de tôdas as qualidades bem como os homens tem à sua disposição lotes incontáveis de fazendas que satisfazem tôdas as exigências.
Lanalgo, L.da, progride, e a sua clientela aumenta dia a dia, com ritmo crescente que significadamente traduz o lisonjeiro acolhimento que a casa mereceu. Dada a competência dos administradores e a lúcida visão comercial que revelaram nesta iniciativa, Lanalgo, L.da por certo atingirá no futuro ainda maior grau de prosperidade e de prestígio.»


Interiores da "Lanalgo" em 1945

Foi um dos grandes estabelecimentos comerciais da Baixa Pombalina, ombreando com a "Companhia dos Grandes Armazéns do Chiado", os "Armazéns Grandella & C.ª" e o "Eduardo Martins & C.ª". Era famoso o slogan publicitário, criado por Manuel Puga: «Três entradas para uma saída feliz». A "Lanalgo" era uma loja com portas de entrada nas ruas de Santa Justa, Correeiros e Prata. Ocupava metade de um quarteirão de 6 pisos que comportava 30 secções comerciais, e cerca de 400 empregados.


23 de Dezembro de 1943


Julho de 1944


 

1961

Em 27 de Maio de 1972 sofreu um grande incêndio. O jornal "Diario de Lisbôa", no dia seguinte relatava:

«... Todas as corporações da cidade e arredores combateram o sinistro durante oito horas. No edifício de cinco andares estava instalada também uma casa de armas e munições. Diversas explosões contribuiram para que o fogo, em determinada altura, assumisse proporções assustadoras. Bombeiros e alguns populares sofreram ferimentos. Os 400 empregados da Lanalgo estão agora, impossibilitados de continuar a sua actividade. Segundo informações colhidas no local, as causas do incêndio ainda não estão determinadas e os prejuízos elevam-se a muitos milhares de contos cobertos pelo seguro.»


Com os prejuízos a ascender a 70 mil contos (70 milhões de escudos), em 5 de Junho de 1972 a "Lanalgo" reabriria, apenas com o 1º andar em funcionamento, «aquele que menor dano sofreu no meio da avalanche de labaredas, água e cinzas.»

Reconstruídos os Armazéns "Lanalgo", no final do ano de 1972, eis que nos anos 80 do século XX, começam os problemas de outra ordem ...

«Mas nos anos 80 deram-se os actos de má gestão e, segundo os trabalhadores, de "desnatação". Mercadoria "saiu" sem o dinheiro ter entrado e pagou-se mercadorias que foram parar a outras empresas.
O descalabro da Lanalgo acabou por dividir a família proprietária Martins Fernandes. As dívidas ao fisco e a fornecedores avolumaram-se. A Lanalgo aderiu ao "Plano Mateus" (plano de regularização especial previsto pelo decreto-lei 124/96), mas entrou em incumprimento. No início de 1999, foi tentado um acordo de viabilidade com o Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas (IAPMEI). O imóvel foi então avaliado em cerca de cinco milhões de euros (um milhão de contos), mas de nada serviu. Havia já 96 credores, onze bancos e ainda os 1,6 milhões de euros (350 mil contos) de créditos dos trabalhadores. Devia-se ao Estado 1,38 milhões de euros (277 mil de contos) de IRC, IRS e IVA. No total, a dívida era 12,67 milhões de euros (2,542 milhões de contos). A queda era inevitável.» (*)



1974



Depois de episódios recambolescos, durante quase uma década, que não vou aqui relatar, o imóvel foi vendido em leilão realizado em 19 de Julho de 2005, pela quantia de 1 milhão e 733 mil de euros. A liquidação judicial da firma "Lanalgo, Lda.", ocorreu em 27 de Julho de 2010.

No lugar da "Lanalgo", instalou-se o "Hotel Santa Justa", de 4 estrelas e propriedade do espanhol "Grupo Preciados", que abriu oficialmente as suas portas, em 1 de Junho de 2013. 

"Hotel Santa Justa"

(*) - Artigo no jornal "Público": "Imóvel da Lanalgo ainda preso na Justiça" de João Rosa de Almeida          em 18 de Abril de 2008.

fotos in: Hemeroteca Digital de LisboaArquivo Municipal de LisboaBiblioteca Nacional Digital

16 de fevereiro de 2025

Cine-Teatro de Gaia

O "Cine-Teatro de Gaia" foi inaugurado em 28 de Dezembro de 1946, na Avenida da Republica, em Vila Nova de Gaia, tendo sido seu fundador Alberto Ferraz Carneiro, sócio gerente da "Sociedade do Cine-Parque da Avenida, Lda.". Em 20 de Fevereiro de 1945, tinha solicitado Câmara Municipal de Gaia a sua construção num terreno pertença da referida sociedade.



25 de Dezembro de 1946


27 de Dezembro de 1946

28 de Dezembro de 1946

O projecto de arquitectura foi entregue ao atelier "Gomes, Nogueira & C.ª, Lda." e obra de engenharia ficou a cargo do gabinete "Engenheiros Afonso Proença". A obra de carpintaria ficou a cargo de José Gomes da Silva, a de serralharia a Manuel Triaes, e os azulejos e mosaicos foram fornecidos pela "Fabrica de Cerâmica do Carvalhido".



Esta luxuosa sala de espectáculos tinha uma área coberta de 1 380 metros quadrados, equipada com aquecimento central e dotada de um equipamento de projecção da marca "Aga - Baltic", à data, de última geração. A sua lotação era de 1 090 lugares, podendo estendê-la até aos 1 200. Possuía um salão de festas, três bares, servindo a plateia, balcão e geral. Na sua construção foram gastos 6.800 contos (seis milhões e oitocentos mil escudos), que na actual moeda seriam: 33.858,00 €.



No mesmo terreno, já em 12 de Abril de 1924 era passado o alvará de exploração e funcionamento do "Teatro Cine-Parque d'Avenida", propriedade de Alvaro Alves de Carvalho, e edificado no gaveto da Avenida da República e da Rua do Parque da Avenida. Refira-se que Álvaro Carvalho era proprietário de uma quinta que confrontava as ruas Joaquim Nicolau de Almeida e Parque da República e, ainda, a Avenida da República. Em 10 de Outubro de 1933, a "Inspecção Geral dos Espectaculos" proibia o funcionamento desta sala de espectáculos, até nova vistoria. Álvaro A. Carvalho acaba então por vender o terreno em que se encontrava o “Teatro Cine-Parque d'Avenida” (que viria a ser demolido) a Alberto Ferraz Carneiro, para ali construir o "Cine-Teatro de Gaia", e lotear a restante área da quinta.

Em 27 de Dezembro de 1946 o jornal "O Comercio do Porto" acerca do "Cine-Teatro de Gaia" escrevia:

«E' amanha, 28, que Vila Nova de Gaia veste as suas melhores galas para solenisar o grande acontecimento, da inauguração do seu Cine--Teatro, situado na linda Avenida e que a vontade forte e o espirito desempoeirado de Alberto Ferraz Carneiro fez erguer, para engrandecimento do populoso concelho de Gaia.
Fizemos uma visita a este esplendido edificio e ficamos maravilhados com o que vimos.
Um edificio optimo em qualquer parte, de linhas arquitectónicas modernas e elegantes e com todos os requisitos duma casa de espectáculos, para servir a todos os géneros.
A' entrada, um vestibulo amplo, ladeado por duas bem lançadas escadas que dão acesso à galeria e geral, logo a seguir um lindo «hall». duma decoração em creme e ouro, com ricos lustres, emprestam ao ambiente o ar de entrada de palácio rico.
Corredores largos, cujas paredes emolduradas por bem dispostas montras, tem um aspecto de maravilha, com luz e conforto, só igualável nos grandes teatros, das grandes capitais.
Por duas escadas laterais, que partem do rico «hall», vamos dar ao balcão, lugar de honra da casa, onde vemos cómodas e confortáveis cadeiras, todas estofadas. Também neste andar, vemos largos corredores, montras, bar, «toilettes» e um rico salão de festas, duma grandesa e graciosidade que bem se aliam ao conjunto do magnifico edificio.
Entramos na sala e não escondemos a nossa admiração, pela forma como estão dispostos e divididos aqueles 1.200 lugares. Uma plateia com perfeita visibilidade, de confortáveis cadeiras, iluminada esplendidamente com um bem delineado candeeiro, com uma profusão de lampadas e que ocupa quase todo tecto.
A decoração de materiais modernos e côres discretas, num conjunto de superior beleza, tornam a sala dum agradável e duma comodidade a que estamos pouco habituados.
Não foi esquecido, pelo conhecimento do seu proprietário, o palco, que esta munido dum urdimento moderno e com uma teia que corresponde às exigências cénicas que modernamente se apresentam.
Os planos do palco, estão estudados convenientemente, a instalação eléctrica para todos os efeitos que requerem as mais complicadas montagens, os camarins de artistas e de conjuntos com instalações de água quente e fria «chauffage» e gabinete médico, dizem-nos que Alberto Ferraz Carneiro viu e estudou tudo, antes de meter ombros a tão grande empreendimento, que em tanto contribui para o engrandecimento de Vila Nova de Gaia, em favor de um Portugal melhor. Uma instalação magnifica de cabines cinematográficas, com uma aparelhagem do que há de mais moderno em transmissão de som, de alta fidelidade e uma excelente instalação de aquecimento, completam as modernas instalações do Cine-Teatro. (...) »

E, em 5 de Janeiro de 1947, o mesmo "O Comercio do Porto" escrevia de novo, enunciando outras informações:

«A localização foi criteriosamente escolhida, de maneira a tornar-se, desde já, tão acessível como é de desejar e chamar a si, no futuro, ainda maiores vantagens. Para os 130 mil habitantes de Vila Nova de Gaia, o Cine-Teatro está em situação de corresponder, de oferecer aquele ambiente de atracção e conforto, que hoje distingue os mais importantes teatros. Os capitais investidos nesta obra merecem compensação e certos estamos de que esta não faltará, em justificada prova de apreço a quem sou e emprega-los, de ânimo generoso e bem intencionado.
A linha do edifício - airoso e amplo-é encantadoramente simples, obediente a novas directrizes, que lhe dão graciosidade e desafogo. E se, exteriormente, o aspecto atrai, interiormente nada lhe falta para categoizá-lo. Proporções amplas, extensos e espaçosos corredores, em três pavimentos, três cómodos «bars», salões de restaurante e café, 25 montras, largas e bem iluminadas, para exposições, num pormenor interessantíssimo, tudo isto forma admirável conjunto. O público usufrui a regalia de lugares convidativos, com absoluta visão; as condicões de acústica são excelentes e a aparelhagem cinematográfica, adquirida na Suécia, é composta por duas moderníssimas máquinas de projecção, últimos modelos, para corrente de alta tensão. Nitidez total, óptima regulação de som - nada falta. Na parte referente aos artistas, em espectáculos de teatro - para os quais tudo foi previsto, em todas as modalidades, o palco tem 10 metros de fundo e 16 de boca - há uma dezena de camarins e dois quartos de banho completos. O corpo coral tem reservada ampla e iluminada quadra. Há, ainda, um posto médico, completo. A luz, no «hall», é fluorescente, e na sala de espectáculos, foi hàbilmente distribuída, em profusão. Paredes artisticamente decoradas, sobressaindo alguns motivos valiosos e um «panneaux» alegórico, de amplas dimensões. E, a completar, a instalação de aquecimento, distribuída por todo o edifício.
Como dados técnicos, diremos que o «écran», com 6 metros de alto e 7 de largo, é todo perfurado - uma novidade no nosso Pais, que protege a vista do espectador e permite maior e melhor sonoridade, além de total nitidez das imagens. Outro pormenor : os números e letras das cadeiras vão ser iluminados, o que facilitará, sensivelmente, a arrumação do publico. Com uma programação notável, que inclui filmes de escolha, a época afirma-se triunfal, em indispensável complemento desta importantíssima obra.
E' assim, numa descrição giobal, o Cine-Teatro de Gaia, moderna casa de espectáculos, que foi estudada e construída para corresponder a todas as exigências. (...)»


5 de Janeiro de 1947

 

Frente e verso do programa





5 de Março de 1947


Frente e verso do programa





Bilhete de 1972

O "Cine-Teatro de Gaia" viria a exibir o seu último filme "A Revolta dos Apaches" em Outubro de 1981, vindo a encerrar no final desse ano.


3 de Outubro de 1981

E no seu lugar, actualmente ...